O teu corpo. O amor
do teu corpo e tudo o que é possível acumular para uma vida, esse resgate
permanente da tua juventude, da tua perfeição que é a nossa identificação para
pronunciar Terra ou Universo ou Deuses. É contigo, com a tua expressão de amor
que em átomos de energia e sorrisos, de pele branca que nos encontramos na mais
desnudada imaginação.
É a construção da
nossa mortalidade, mas é mais do que apenas material. É feita de
deslumbramento, de mistério e de impossível, pois a ternura só se formula nessa
criação de doçura. Uma doçura capaz de em momentos de tempo mais lento permitir
a nossa criação, entre a tua agilidade, o teu riso de nuvem, os teus cabelos
soltos em caracóis, as tuas mãos de chuva, a tua vitalidade de mármore feita
corpo transbordante de alegria.
E agora que sucumbo
às feridas do tempo, em que tropeço nas minhas mãos gastas, com linhas de chuva
escorrendo, como gotas de vidraças ensombradas de vento vejo as áleas da janela
que resistem aos dias seguidos de rotina. Decoram o mais longe, com braços
esguios nascidos em rugas que o tempo acastanhou e de onde flores de vento se
erguem como pequenos jardins. E deste amor que se lembra, como amar-te agora em
rugas de silêncio, no tempo do acontece, na essência da eternidade, acima da
memória descalcificada. O sublime é sempre uma iluminação, ama-se com esse
sentido de circunstância, a forma de escrever eternidade, como quando os astros
se juntam numa galáxia de luz.
É o ponto inicial e
final de consumir beleza, o fascínio encontrado nos teus olhos, o amor do qual
não sabíamos sair, o mundo que não existe, as formas maciças de toda a
expressão corporal, o fundamento da terra. E em casas, como árvores ouvíamos a
folhagem, o silêncio do absoluto, os seres da terra, a sua música e talvez
também Deus. E era para superar a nossa mortalidade e o seu poder, a sua
omnipotente vaidade que nos amávamos até que perdemos o que era o amor, essa
canção sem lobos.
E dos momentos em que
partiste tornou-se impossível recuperar as formas e o movimento de como, de
quanto te amei. As formas possíveis do que fomos, a nossa ontologia, como uma
natureza viva que já não se recupera no desenho do teu rosto, pois já não sobra
do real que vejo. O amor éramos nós nesses tempos de rio e bosques e com o
universo fomos só uma forma de eternidade. O corpo que se transcende de
angústia de tempo deu-nos essa totalidade de nós. O que farei desse sonho de
nuvem?
Com as palavras de
Vergílio ou o que elas me dizem. Vergílio Ferreira. (1990). em nome da terra.
Imagem: © – Acompletelife.
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