quinta-feira, 30 de abril de 2020

Minutos de Leitura (IX-3.º Ciclo)

"A minha mãe.
É a mãe mais bonita,
Desculpem, mas é a maior,
Não admira, foi por mim escolhida,
E o meu gosto, é o melhor,
E esta é a canção mais feliz,
Feliz eu que a posso cantar,
É o meu maior grito de vida
Foi o seu grito, o meu despertar,
Canção de mãe a sorrir,
Canção de berço de embalar,
Melodia de dormir,
Mãe ternura a aconchegar,
Canção de mãe a sorrir,
Gosto de ver e ouvir,
Voz imagem de sonhar,
Imagem viva lembrança,
Que faz de mim a criança,
Que gosta de recordar
A minha mãe,
É a mãe mais amiga,
Certeza, com que eu posso contar,
E nem por isso, sou a imagem que queria,
Mas sempre me soube aceitar,
Razão de mãe a dizer,
Mãe cuidado a aconselhar,
Os cuidados que hei-de ter,
As defesas a cuidar,
Saudade mãe a escrever,
Carta que vou receber,
Notícia de me alegrar,
Cartas, visitas encontros,
Essa troca que nós somos,
Este prazer de trocar,
Canção de mãe a sorrir,
Gosto de ver e ouvir,
A ternura de cantar."

António Variações, Deolinda de Jesus
Imagem: Copyright - Gustave Klimt, Mãe e filho, 1917.

Minutos de leitura (IX)

"Uma senhora tinha três filhas.
Três tesouros.
Valiam mais de mil sacos de ouro.
Nunca trocaria as filhas por nada, nem guloseimas nem maravilhas.
As filhas da senhora eram as suas maiores alegrias, as suas companhias.
Com elas passava os dias, e os dias eram só amor que aumentava.
A senhora sorria.
Uma senhora tinha três filhas.
Três tesouros.
Valiam mais de mil sacos de ouro.
E as filhas brincavam e cantavam de contentes.
Passavam os dias a fazer coisas diferentes.
Inventavam peripécias, vestiam disfarces, sonhavam com árvores quando espalhavam sementes.
Iam quintal fora, tão vistosas, com as mãos estendidas sobre a terra, e a terra preperava-se para ser cultivada.
… A senhora sorria
Uma senhora tinha três filhas.
Três tesouros.
Valiam mais de mil sacos de ouro.
Dormiam numa cama grande, as filhas, alinhadas por ordem de chegada: primeiro a mais velha, depois, a do meio e, por último, a mais nova.
A senhora dizia-lhes boa noite e beijava-as. As filhas sossegavam.
Achavam que, deitadas, adormeciam como a andar nas nuvens. Voavam.
Uma senhora tinha três filhas.
Três tesouros.
Valiam mais de mil sacos de ouro.
Estavam as filhas doentes e o importante era esperar.
Fazer o que mandava o doutor e esperar.
A senhora penteava uma e outra e mais outra.
A senhora beijava uma e outra e mais outra.
A senhora sorria para uma e outra e mais outra.
As filhas acreditavam que no coração da mãe
Havia uma corda atada ao coração de todas elas, porque a senhora era incapaz de parar de amar.
Ela era incapaz de parar.
E a senhora esperava.
Uma senhora tinha três filhas.
Três tesouros.
Valiam mais de mil sacos de ouro.
Tão felizes ficaram todas por estarem bem de saúde…
Tinham sido corajosas.
Só precisaram de esperar. E esperariam sempre por uma e outra e mais outra.
E a senhora disse: - Eina, que estou tão feliz.
E as filhas riram-se com ela. Juntas, as filhas e a mãe eram na verdade quatro tesouros.
Uma e outra e outra e mais outra. Quatro tesouros.
De amor.
Valiam mais do que todos os sacos de ouro juntos."

Quatro tesouros / Valter Hugo Mãe. Lisboa. Alfaguara. 2011.
Em baixo apresentação do livro que é um projeto da Pediatria Oncológica do Hospital de São João com o escritor Valter Hugo Mãe.

quarta-feira, 29 de abril de 2020

Estava um melro empoleirado no alto da manhã. Antes que conseguisse deitar-lhe a mão, o coração soltou-se-lhe e voou até ele. Pássaro e coração agora juntos no alto da manhã. 

Tinha oito anos e um laçarote novo ao pescoço. Toda catita! Ia a um concerto e a mãe tinha querido que fosse bem aperaltado. Afinal, não era um concerto qualquer. Ia sentar-se ao piano e tocar! Sentia-se estranho com aquele laço, mas a mãe tinha tido tanto empenho a fazê-lo...

Aprendera com ela a tirar sons com melodia do teclado em carreirinhas brancas, semeado e carreirinhas pretas. 
Assustado, o coração, com tanta gente a espreitá-lo.

Chegado a casa, salta a pergunta ansiosa da mãe:
- Então, Chopinek?
Não responde logo, hesita. Depois, agilmente, como pássaro libertado:
- Acho que gostaram do meu laço novo...

Debruça-se sobre o piano, desperta as carreirinhas . Desperta a casa, a imaginação. Desafia sonhos de viagens, movimentos de danças, serões sob as estrelas, vozes que correm, passos ritmados, pé leve. Descobre-nos a alma.

Justina, a mãe da casa, esqueceu-se do movimento que ia fazer...

Luísa deixa-se transportar nas mãos do irmão. Querido Fréderic...

Isabel talvez dormisse, talvez não...

Interrompido o choro de Emília, esquecida a razão.

Nicolas, o pai da saca, suspenso no dia.

O som espraia-se e apaga o mundo, acorda o espaço.

Movem-se as carrerinhas brancas, semeadas de carreirinhas pretas, sob os dedos de Fréderic François Chopin.

O meu primeiro Chopin / Rosa Salvado Mesquita. Alfragide: D. Quixote, 2009

Minutos de Leitura (VIII-3.º Ciclo)

Quantos caminhos terá um homem de percorrer 
antes que o considerem um homem?
Quantos mares terá uma pomba branca de sulcar
antes que possa descansar na areia?
Quantas vezes terão os canhões de disparar
antes de serem banidos para sempre?
A resposta, meu amigo, está no vento que passa,
a resposta está no vento que passa.
Quantas vezes terá um homem de erguer a cabeça
antes de conseguir ver o céu?
E quantos ouvidos terá de possuir
até que consiga ouvir as pessoas chorar?
Quantas mortes serão necessárias até que saiba 
que já morreu gente demais?
A resposta, meu amigo, está no vento que passa,
a resposta está no vento que passa.
Quantos anos pode uma montanha existir
antes de ser arrastada para o mar?
Quantos anos podem certas pessoas viver
antes que lhes permitam ser livres?
E quantas vezes pode um homem virar a cara
Fingindo que não vê o que vê?
A resposta, meu amigo, está no vento que passa,
a resposta está no vento que passa.

Minutos de leitura (VIII)

Estava um melro empoleirado no alto da manhã. Antes que conseguisse deitar-lhe a mão, o coração soltou-se-lhe e voou até ele. Pássaro e coração agora juntos no alto da manhã. 

Tinha oito anos e um laçarote novo ao pescoço. Toda catita! Ia a um concerto e a mãe tinha querido que fosse bem aperaltado. Afinal, não era um concerto qualquer. Ia sentar-se ao piano e tocar! Sentia-se estranho com aquele laço, mas a mãe tinha tido tanto empenho a fazê-lo...

Aprendera com ela a tirar sons com melodia do teclado em carreirinhas brancas, semeado e carreirinhas pretas. 
Assustado, o coração, com tanta gente a espreitá-lo.

Chegado a casa, salta a pergunta ansiosa da mãe:
- Então, Chopinek?
Não responde logo, hesita. Depois, agilmente, como pássaro libertado:
- Acho que gostaram do meu laço novo...

Debruça-se sobre o piano, desperta as carreirinhas . Desperta a casa, a imaginação. Desafia sonhos de viagens, movimentos de danças, serões sob as estrelas, vozes que correm, passos ritmados, pé leve. Descobre-nos a alma.

Justina, a mãe da casa, esqueceu-se do movimento que ia fazer...

Luísa deixa-se transportar nas mãos do irmão. Querido Fréderic...

Isabel talvez dormisse, talvez não...

Interrompido o choro de Emília, esquecida a razão.

Nicolas, o pai da saca, suspenso no dia.

O som espraia-se e apaga o mundo, acorda o espaço.

Movem-se as carrerinhas brancas, semeadas de carreirinhas pretas, sob os dedos de Fréderic François Chopin.

O meu primeiro Chopin / Rosa Salvado Mesquita. Alfragide: D. Quixote, 2009

terça-feira, 28 de abril de 2020

Minutos de Leitura (VII-3.º Ciclo)

Percorria ao anoitecer os jardins
da cidade à procura das flores
oficiais - sobem amparadas
e perfumam com a memória
do chá as ruas irregulares.
Levava uma tesoura de unhas,
insuficiente e desnecessária porque
não colhia nada que fosse vivo.
Restavam-me frases livres,
páginas dobradas, cadeiras desiguais
e os pratos vazios deixados
aos gatos.
O primeiro poema encontrei-o
numa dessas buscas
debaixo da árvore maior,
no ferro que sustenta a copa,
preso com uma mola da roupa.
Margarida Ferra. (2010). "Nome comum: Jasmim-dos-Poetas", in Curso Intensivo de Jardinagem. & Etc.

Minutos de leitura (VII)

"O avô comprou um pequeno barco de fundo chato para remar através dos campo inundados quando a estação das chuvas chegasse. Disse que era uma maneira agradável de escapar à azáfama da avó. Kati e o avô saíam sozinhos no barco. Partiam ao fim da manhã, o avô  a remar com todo o vagar, percorrendo o canal e contemplando as árvores de fruto que cresciam ao longo das margens: mangueiras e jamboeiros misturados com casuarinas que se davam bem à beira da água. 

O avô não parava para descansar, mas cumprimentava todas as pessoas que via. O tio Sohn estava a içar a rede do cais diante de sua casa e parecia que fizera uma boa apanha de peixe tapean. O avô prometeu que, no regresso a casa, parariam ali para comprar alguns a fim de que a avó os marinasse em molho de anchovas para o jantar de Kati.
O barquinho afastou-se da sombra protectora da margem e dirigiu-se ao campo aberto que parecia estender-se a toda a  largura e profundidade que a vista alcançava. A esteira de água que deixavam atrás de si era encrespada por uma leve brisa e, ao longe, os arrozais cintilavam dum verde garrido. O avô deixou o barco ir à deriva até ao meio do campo e começou a colher caules de lírios. ERra preciso estar com todo o cuidado para ter a certeza de que colhia lírios pun e não lírios peuan, que tinham um sabor amargo. 
Os lírios  pun tinham flores amarelo-vivas e folhas arredondadas sem veios. Os seus caules frescos e estaladiços eram deliciosos quando saboreados com o molho de chili picante com que a avó  recheara as folhas de lírios acompanhadas com arroz recém-colhido para o almoço de ambos. Kati entretinha-se a despedaçar os caules dos lírios aos bocadinhos e a tornar a juntá-los num colar. Às vezes viu um aglomerado de krajup. Preferia-os às castanhas-de-água e o avô amontova-os no fundo do barco para os levarem e comerem cozidos.
Depois havia ainda os jacintos-de-água com as suas frágeis flores púrpura-pálidas. Se as segurássemos nas mãos, era um ápice enquanto murchavam. As campainhas brancas também eram bonitas. O avô dissera-lhe que artistas como Monet eram capazes de as pintar na tela tão bonitas como ao vivo.
O avô remava tranquilamente, sem se preocupar com a hora a que saíra de casa, aonde teria de ir a seguir nem quando teria de regressar. Dissera que não estavam a fazer uma excursão sujeita aos ditames dos horários dos comboios. Estavam a fazer uma excursão sujeita aos ditames dos seus corações.
O barco de fundo chato com as suas tábuas robustas dava um excelente meio de transporte. Não poluía o ambiente e rasgava as águas límpidas segundo a cadência do remador. Se remasse em direcção a um bando de alfaiates, estes insectos fugiam desvairados, dando azo ao caos. O avô e Kati dispensavam palavras. Ao invés, deixavam que o pequeno barco e a água se cumprimentassem. O Sol parecia muito longínquo no céu, pese embora os seus raios fossem agora fortes. 
à sua volta, porém, a água cobria completamente o arrozal, exercendo um efeito refrescante que afastava o calor. Dava a sensação de que o tempo se imobilizara. A água e o céu, o vento e sol enquadravam uma imagem no centro da qual flutuava o barquinho. Todavia, nenhum barco é capaz de avançar indefinidamente sem acabar por chegar ao seu destino, por muito encantadora que a viagem seja.

A felicidade de Kati / Jane Vejjajiva. Barcarena: Editorial Presença, 2011. 

segunda-feira, 27 de abril de 2020

Minutos de Leitura (VI-3.º Ciclo)

"Há muito tempo, quando era um rapaz da tua idade e vivia numa pequena ilha rodeada de castanheiros, oliveiras e carvalhos que conheciam histórias centenárias mas não as contavam a ninguém, a minha forma preferida de dar a volta à ilha e de regressar à Casa do Roseiral era na mota do meu pai.
O meu pai era na altura, na cabeça de um rapaz de dez anos, um herói que tinha participado na guerra em África e tinha matado muitos homens. Era um herói que conhecia os caminhos todos que davam a volta à ilha e os podia fazer de olhos vendados na Famel. Era um herói que - se quisesse - abria os braços e deixava que a mota o levasse a voar por todas as terras que circundavam a ilha onde morávamos.
Desde que chegara da guerra e que prometera à minha mãe que um dia iria levá-la para fora daquela ilha, o meu pai passava os dias na forja ao lado da Casa do Roseiral. Afiava os picos que precisava para cortar o granito ou martelava horas seguidas até dar forma às pedras que usava para fazer os trabalhos que lhe eram encomendados. Encomendavam-lhe alguns trabalhos, embora, na opinião da minha mãe, lhe pagassem muito pouco pelo suor que resultava do esforço. (...)
Fazia muitas pausas, mas acho que as fazia em segredo. É que quando ouvia a minha mãe ou a avó por perto, a subir ou a descer as escadas da Casa do Roseiral para levarem uma encomenda de  roupa nova engomada aos senhores que viviam no Bairro das Andorinhas, o meu pai escondia, apressadamente, as figuras que moldava em pedra ou ferro e fingia que continuava com os seus trabalhos, batendo com uma força desproporcional num pico que ficava sempre de lado para essas ocasiões.
- Não demoro nada. Já volto! - dizia a minha mãe. E partia com um cesto debaixo do braço esquerdo, cheia de vida, a contar as horas até ao dia em que o meu pai a levaria para fora daquela ilha. 
Mal ela dobrava a esquina, ele regressava, com os olhos cheios de fantasia, às suas esculturas. Moldava figuras humanas de tamanho minúscu7lo, que eu colocava em filas, e pequenas armas em ferro para pormos ao ombro de cada uma das figuras. Por vezes, enquanto eu me entretinha a imaginar batalhas nas terras distantes de África, onde ele dizia que tinha combatido, o rosto de uma mulher ou formas estranhas que faziam lembrar pássaros a voar saíam-lhe das mãos.
Mas talvez não fossem pássaros. Talvez fossem motas voadoras que o iriam levar para fora daquela ilha que lhe saía das mãos.
Às vezes, a minha mãe, incitada pela avó, que vivia no Bairro da Capela, numa casa cheia de fotografias de parentes antigos que moravam no Brasil e na América, virava-se par o meu pai:
- Não entendo! O Joaquim saiu no mês passado com a António. Já escreveu a contar que está tudo bem e a Lúcia, em breve, junta-se a ele. Só tu é que... é que nunca mais! Vamos apodrecer aqui! Tu, nessa forja, e eu, na máquina de costura. 
Quando essas conversas aconteciam - e ultimamente aconteciam cada vez com mais frequência -, o meu pai, que era um herói que tinha participado na guerra em África e tinha matado muitos homens, olhava para mim, abria muitos os olhos, encolhia os ombros, pegava na mota, que estacionava ao lado da forja, debaixo do roseiral e, com a cabeça a fantasiar, dizia:
-- Anda! Vamos dar uma volta!"
Volta ao mundo na mota do meu pai / Raquel Ramos; il. a. mar. Porto:  Coolbooks, 2019

Minutos de Leitura (V-3.º Ciclo)

"Passar o tempo?  disse a Rainha. - Os livros não são para passar o tempo. São sobre outras vidas. Outros mundos. Longe de querer que o tempo passe, Sir Kevin, quem nos dera ter mais. Se quiséssemos passar o tempo, íamos à Nova Zelândia. Sir Kevin retirou-se magoado. Mesmo assim marcou um ponto e ficaria contente ao saber que deixou a rainha perturbada e a pensar porque é que, neste momento particular da sua vida, sentira subitamente atração pelos livros. Donde surgira esse apetite?
Sim poucas pessoas tinham visto mais mundo do que ela. Quase não havia país que não tivesse visitado, personalidade ilustre que não tivesse conhecido. Estando ela própria na tribuna do mundo, porque se entusiasmava agora com livros que, por muito que pudessem ser, não passavam de um reflexo ou versão do mundo? Livros? Ela vira a realidade.
- Eu leio e penso - disse a ela a Norman --, porque temos o dever de descobrir como são as pessoas.  O comentário fora tão trivial que Norman não lhe dera muita atenção, pois não sentia esse dever e lia por puro prazer e não para se iluminar ou inspirar, embora soubesse que parte do prazer era inspiração. Mas ali o dever não entrava.

Para alguém com a formação da Rainha, no entanto, o prazer ocupara sempre o segundo lugar em relação ao dever. Se sentisse que tinha o dever de ler, então podia dedicar-se a isso de consciência limpa, e o prazer, se prazer houvesse, seria inerente. Mas porque é que aquilo se apoderara dela agora? Não discutiu isso com Norman, por sentir que dizia respeito a quem ela era e à posição que ocupava.

O apelo da leitura, pensou, vinha da sua indiferença: havia na literatura algo de nobre. Os livros não se importavam com quem os lia, nem se os líamos ou não. Todos os leitores eram iguais, incluindo ela própria. Pensou: a literatura é uma comunidade; as letras uma república. (...)

Os livros não se submetiam. Todos os leitores eram iguais e aquele livro levou-a ao princípio da sua vida. Quando era nova, uma das suas maiores emoções foi a noite da Vitória na Europa, em que ela e a irmã se esgueiraram pelos portões incógnitas, e se misturaram com a multidão. Sentia que havia algo disso na leitura. Era anónima, partilhada, comum. E ela, que levara uma vida à parte, ansiava por isso. Aqui, nestas páginas e entre estas capas, podia seguir incógnita.

Porém, dúvidas e interrogações eram só o princípio. Uma vez no ritmo normal, deixou de lhe parecer estranho o facto de querer ler, e os livros, aos quais se afeiçoara tão cautelosamente, passaram pouco a pouco  a ser o seu elemento."

A leitora real /Alan Bennett. A leitora real. Alfragide: Asa, 2009.

Minutos de leitura (VI)

"Era uma vez uma menina chamada Branca, que vivia pobremente com seus pais e irmãos numa casa em Vila Nova de Gaia, que hoje é cidade, mas na altura era quase uma aldeia, com pinhais, feiras, romarias e caminhos de terra.
Branca, todos os dias, logo pela manhã, ia até so pinhal com sua mãe para apanhar grandes molhos de caruma, para seu pai alimentar o forno de fazer carvão. Era uma família de carvoeiros. E o seu carvão de madeira era conhecido pela excelente qualidade: era duro, compacto, e ao partir tinha reflexos brilhantes tão intensos, que parecia polvilhado de partículas de um cometa!
A casa de Branca era próxima da casa de António Soares dos Reis, um escultor, um professor das Belas-Artes. Era uma casa estranha, a do escultor. Tinha uma janela grande por cima da porta, voltada para a rua, onde Branca nunca via ninguém, nem se abria para arejar a casa! Às vezes saía pela porta pequena uma senhora com um carrinho de bebé com grandes rodas, que Branca admirava. 

Um dia, António Soares dos Reis, ao sair de casa, viu a menina sentada no passeio da sua casa, com um vestido branco e um casaaco, já pequeno, de lã rosa. Comia um pão e apoiava-se a um velho cobertor esfiado, que tinha no regaço, onde costumava embrulhar a caruma. As mãos e a cara tinham alguns ferretes de carvão, o que lhe dava um ar engraçado. Parecia um desenho pousado no chão!

Isso foi motivo que estimulou o escultor a fixar a bonita cara de Branca. Parou e perguntou-lhe: "A tua mãe vem aí?"
"vem, sim senhor."
"Queres que eu faça a tua cara em barro?"
"Esta janela não abre?", perguntou Branca, sem perceber.

O escultor não teve tempo de responder, a mãe de Branca aproximava-se, ele dirigiu-se a ela, perguntando se o autorizava a fazer o retrato da sua filha, que tinha um rosto tão fresco, tão gentil, tão puro como uma flor agreste!

Como a mãe de Branca lhe disse logo que sim, ela passou a ir, uma tarde por outra, ao atelier do escultor. Tantas figuras de senhores e senhoras, alinhados em prateleiras altas! Tantos frascos com pincéis e facas de madeira macia! Tanto papel para desenhar! E paus de carvão!

O escultor sentou-a num banquinho de bunho, em cima de um estrado, e começou a moldar um bloco de barro com as mãos. Rapidamente a forma de um rosto, de um pescoço, de uma roupa começou a surgir.Branca admirava aquela rapidez, parecia-lhe magia!

Em poucos dias o rosto ficou acabado, em barro. Depois o escultor iria passá-lo a mármore, a um mármore que vinha de Itália e seria branco, para dizer com o nome e a lama de Branca.

Ao olhar o seu retrato, a menina-flor, como lhe chamava António Soares dos Reis, perguntou:"Eu vou ficar assim para sempre?Não vou crescer?!
"Sim...", disse o escultor, olhando as nuvens transparentes, através da janela grande."
"A flor agreste", in Do outro lado quadro / Mónica Baldaque. Alfragide: Asa, 2010.
Imagem: escultura de Soares dos Reis, "Flor agreste", in Museu Soares dos Reis, Porto.

sexta-feira, 24 de abril de 2020

Minutos de Leitura (IV-3.º Ciclo)

“Azul? Essa cor toda enorme…” (a criança)


"Já pouco se movem os corpos no fim desta tarde. Ouço vozes que terão vindo de outros lugares.
A verdade é que isso me incomoda. Prefiro vozes que condigam com aquilo que olho. De repente, ou do calor ou do vinho, já não sei bem da geografia do lugar onde me encontro.

Pequenas palavras caem como pingos de chuva. Pequenas ideias, murmúrios de sonhos, restos de coisa dita superficialmente. Talvez a minha missão nesta cidade seja catar estes restos e montar um puzzle maior. Talvez eu não tenha missão alguma. Talvez eu não esteja aqui. E o pior de não se estar num lugar é o esforço de definir um outro lugar onde se esteja.

- Usa uma âncora...
A frase antiga, é do meu avô paterno. O pescador. 
- Ferra a âncora - ouço-o dizer-me.

Defino, com esforço, que ele esteja aqui comigo.
Agora. Mas a âncora é o presente. Ele talvez seja a canoa. Ou ele - ou eu.
Ancorar-me. Olhar o que posso ver, ajustar as vozes aos corpos. Encaixar o que foi - fôr - dito aos corpos que respiram e se movem. Libertar-me do calor e do peso. Não ser um, mas "mais um".

- Ferra a âncora, agora!
Obedeço. Humedeço os olhos com o tom da sua voz. Eu queria uma estória. uma estória de pescador. O que elas têm de mágico é quase sempre fugirem ao banal. Lembro-me de pensar isto desde criança: são de verdade as estórias dos pescadores. São sempre simples. São sempre breves. Límpidas. São belas sem se afastarem da textura do sal. A pele queimada, limpa: é isso que lembram as estórias dos pescadores.

Ferrei a âncora. Encontrei sons e sorrisos correspondentes. As vozes reencontraram-se com as bocas presas aos corpos. Respiro ainda devagar.
Na curva de uma chávena, vejo o reflexo do meu rosto. Sou uma criança sentada a rir das estórias breves do meu avô. E outra. e outra mais.

- Há muito silêncio nas tuas estórias. nos teus dias. No teu mar - provoco.
- É uma âncora. Tu gostas de palavras. Nunca serias pescador. Talvez poeta. Se eu disser "azul", tu vês o quê? - o meu avô faz uma careta de pele queimada.
Não respondi. Fiquei quieto. Os corpos moviam-se ao fim da tarde.
Ele insistia com essas palavras em pingos de chuva:
- Eu vejo o céu. Só o meu céu. Azul e simples.

Humedeço os olhos com o tom da tua voz. ele não tinha fugido ao banal. Mas, dito por um pescador, já não era banal.
- para mim "azul" pode ser a parte de dentro das pessoas - murmuro eu.
Ferro a âncora. deixo que a voz reencontre o meu corpo. Talvez eu não esteja aqui, em Moçâmedes, com o meu avô.
De repente, já posso respirar fundo."

Ondjaki. (2014). "Moçâmedes", in Sonhos azuis pelas esquinas. Lisboa: Caminho.
Imagem - Moçâmedes (http://mossamedes-do-antigamente.blogspot.pt)

Minutos de leitura (V)

Escura e pequenina
É assim a andorinha
Que todos os anos regressa
Para viver no meu terraço.
Quando chega a primavera,
Lá estou eu, à sua espera,
Para darmos um abraço.

Gosto de a ouvir contar
As histórias de espantar
Das terras que visitou:
De piratas, feiticeiros,
Mamutes, peixes falantes,
De reis, dragões e gigantes,
Princesas e marinheiros.

A minha querida amiga
Já me prometeu que  um dia
Me leva a conhecer o mundo
Desde a China à Guatemala.
Por isso, pelo sim pelo não,
Sempre que acaba o verão,
Eu corro a fazer a mala!

Manuela Leitão, "Andorinha", in As Quatro Estações. Lisboa: Máquina de voar, 2017.
Imagem: Copyright - R.B.Davis

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Minutos de leitura (IV)

"Se eu fosse um livro,
Pediria a quem me encontrasse na rua
Para me levar para casa consigo.

Se eu fosse um livro,
Havia de partilhar com os meus leitores
Os segredos mais antigos e secretos.

Se eu fosse um livro
Gostava de ter sempre um lugar reservado
No quarto m´agico de uma criança.

Se eu fosse um livro,
Pedia às pessoas para não me usarem
como ornamento de prateleiras.

Se eu fosse um livro,
Saberia tanto de Nova Iorque
Como da Roma Antiga. 

Se eu fosse um livro,
Havia de ser lido às tantas
Por quem, em silêncio, me chamasse "Amigo".

Se eu fosse um livro,
Gostava de ser um arranha-céus
Todo feito de letras e sons.

Se eu fosse um livro,
Gostava de ser uma janela aberta
Para a imensidão do mar. 

Se eu fosse um livro,
Havia de querer ser, antes de mais nada,
sempre lido e livre.

Se eu fosse um livro,
Seria um imenso poema
Que oferecesse às palavras sentidos inesperados."

Se eu fosse um Livro / José José Jorge Letria, Il. de André Letria. Porto Salvo: Pato Lógico; 2011.

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Minutos de Leitura (III-3.º Ciclo)

“O Grande Chefe de Washington comunicou-nos o seu desejo de comprar as nossas terras. O Grande Chefe assegurou-nos também da sua amizade e de quanto nos preza. Isso é muito generoso da sua parte, pois sabemos que ele não necessita da nossa amizade.

Porém, vamos considerar a sua oferta, pois sabemos que se o não fizermos, o homem branco virá com armas e tomará as nossas terras. Mas, como pode comprar ou vender o céu e o calor da terra? Tal ideia é estranha para nós. Se não somos os proprietários da pureza do ar ou do resplendor da água, como podes comprá-los a nós?

Cada torrão desta terra é sagrado para meu povo. Cada folha reluzente de pinheiro, cada praia arenosa, cada clareira e cada zumbido de insecto são sagrados nas tradições e na memória do meu povo. A seiva que corre nas árvores transporta consigo as recordações do homem de pele vermelho. O homem branco esquece a sua terra natal, quando, depois de morto vai vagar por entre as estrelas. Os nossos mortos nunca esquecem a beleza desta terra, pois ela é a mãe do homem de pele vermelha. Somos parte destas terras como elas fazem parte de nós.

As flores perfumadas são nossas irmãs; o veado, o cavalo, a grande águia - são nossos irmãos. As cristas rochosas, as seivas das pradarias, o calor que emana do corpo de um pónei e o próprio homem, todos pertencem à mesma família. Assim, quando o Grande Chefe de Washington manda dizer que deseja comprar nossa terra, ele exige muito de nós. O Grande Chefe manda dizer que nos reservará um lugar em que possamos viver confortavelmente e que será para nós como um pai e que nós seremos seus filhos.
Vamos considerar a sua oferta de comprar a nossa terra, embora isso não seja fácil, pois esta terra é sagrada para nós. A água cintilante dos rios e dos regatos não é apenas água, é o sangue dos nossos antepassados. Se vendermos a nossa terra, terás de te lembrar que ela é sagrada e deverás ensiná-lo aos teus filhos e fazer-lhes saber que cada reflexo na água límpida dos lagos fala do passado e das recordações do meu povo. O murmúrio das águas é a voz do pai de meu pai. Os rios são nossos irmãos, matam-nos a sede, transportam-nos nas canoas e alimentam os nossos filhos. Se vendermos a nossa terra, terás de te lembrar e ensinar aos teus filhos que os rios são nossos e vossos irmãos, e terás de dispensar-lhes a bondade que darias a um irmão.

Nós sabemos que o homem branco não compreende o nosso modo de viver. Para ele um pedaço de terra vale o mesmo que outro, porque ele é um forasteiro que chega na calada da noite e tira da terra tudo o que necessita. A terra não é sua irmã, mais sua inimiga, e depois de a conquistar prossegue o seu caminho. Deixa para trás as sepulturas dos seus antepassados e isso não o importa. Apodera-se das terras dos seus filhos e isso não o inquieta. Ele considera a terra, sua mãe, e o céu, seu irmão, como objectos que podem ser comprados, saqueados ou vendidos como ovelhas ou miçangas cintilantes. Na sua voracidade arruinará a terra e deixará atrás de si apenas um deserto.

Não sei. Nossos caminhos diferem dos vossos. As vossas cidades ferem os olhos do homem de pele vermelha. Não há lugares calmos nas cidades do homem branco. Não há sítios onde se possa ouvir as folhas a desabrochar na primavera ou o zunir das asas dos insectos. O barulho que tudo domina ofende os ouvidos do homem de pele vermelha. Para que serve a vida se um homem não pode escutar o grito solitário do noitibó ou a lengalenga nocturna das rãs à volta de um pântano ? Sou um homem de pele vermelha e não compreendo, talvez porque os homens de pele vermelha são selvagens e ignorantes. O índio prefere o suave sussurro do vento roçando a superfície de uma lagoa e o perfume do ar lavado pela chuva do meio-dia ou carregado do aroma dos pinheiros.

O ar é precioso para o homem de pele vermelha, porque todas as criaturas partilham a mesma aragem: os animais, as árvores, o homem todos respiram o mesmo ar. O homem branco parece indiferente ao ar que respira. Como um moribundo em prolongada agonia, ele é insensível ao ar fétido. Mas se vendermos as nossas terras, deverás recordar que o ar é precioso para nós, que o ar reparte o seu espírito com toda a vida que ele sustenta. O vento que deu o primeiro sopro de vida ao nosso antepassado recebe também o nosso último suspiro. 


Se vendermos as nossas terras, deverás conservá-la como um lugar reservado e sagrado, onde o próprio homem branco possa saborear o vento perfumado pelas flores da pradaria. Assim pois, vamos considerar a oferta para comprar a nossa terra. Se decidirmos aceitar, será com uma condição: O homem branco deverá tratar os animais desta terra como se fossem seus irmãos. Sou um selvagem e não compreendo outros costumes. Eu vi milhares de búfalos a apodrecer na pradaria, abandonados pelo homem branco que os abatia de um comboio em movimento. Eu sou um selvagem que não compreende que o cavalo de ferro fumegante possa ser mais importante do que o búfalo que nós, os índios, matamos apenas para o sustento de nossa vida. O que seria do homem sem os animais? Se todos os animais desaparecessem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Porque tudo quanto acontece aos animais não tarda a acontecer ao homem. Todas as coisas estão relacionadas entre si.

Deverão ensinar aos vossos filhos que o chão debaixo dos seus pés é feito das cinzas dos nossos antepassados. Ensinem aos vossos filhos o que temos ensinado aos nossos: que a terra é nossa mãe. Tudo quanto fere a terra fere os filhos da terra. Se os homens cospem no chão é sobre eles próprios que cospem. Uma coisa sabemos: a terra não pertence ao homem, é o homem que pertence à terra. Disto temos certeza. Todas as coisas estão interligadas, como o sangue que une uma família. Tudo está relacionado entre si. Tudo o que acontece à terra acontece aos filhos da terra. Não foi o homem quem teceu a teia da vida, ele não passa de um fio da teia. Tudo que ele fizer à trama, a si próprio fará."

“Talvez Sejamos Irmãos” – Carta resposta do Chefe Índio Sealth à proposta de aquisição das terra onde vivia a sua tribo do Presidente dos Estados Unidos da América, Franklin Pierce em 1854.

Minutos de leitura (III)

"Era uma vez, em tempos muito antigos, no arquipélago do Japão, uma árvore enorme, que crescia numa ilha muito pequenina. Os japoneses têm um grande amor e um grande respeito pela Natureza e tratam todas as árvores, flores, arbustos e musgos com o maior cuidado e com um constante carinho.

Assim, o povo dessa ilha sentia-se tão feliz e orgulhoso por possuir uma árvore tão grande e tão bela. Em nenhuma outra ilha do Japão, nem nas maiores, existia outra árvore tão grande. Até os viajantes que por ali passavam diziam que mesmo na Coreia e na China nunca tinham visto uma árvore tão alta, com a copa tão frondosa e bem formada.


E, nas tardes de verão, as pessoas vinham sentar-se debaixo da larga sombra e admiravam a grossura rugosa e bela  do tronco, maravilhavam-se com a leve frescura da sombra, o suspirar da brisa entre as folhas entre a perfumadas.

Assim foi durante várias gerações.

Mas com o passar do tempo surgiu um problema terrível, e por mais que todos meditassem e discutissem ninguém era capaz de arranjar uma boa solução.

Porque, ao longo dos anos, a árvore tinha crescido tanto,os seus ramos tinham-se tornado tão compridos, a sua folhagem tão espessa e a sua copa tão larga que, durante o dia, metade da ilha ficava sempre à sombra.
De maneira que metade das casas, das ruas, das hortas e dos jardins nunca apanhava sol.

E, na metade ensombrada, as casas estavam a ficar húmidas, as ruas tinham-se tornado tristes, as hortas já não davam legumes, os jardins já não davam flor. E a gente que ali morava andava sempre pálida e constipada.

E, à medida que a sombra da árvore crescia, crescia também a perturbação. As pessoas gemiam:
- Que havemos de fazer?

Até que foi decidido a população reunir-se toda em conselho para examinar bem o problema e decidir o remédio que lhe devia dar.
Discutiram durante muitos dias, e depois de todos terem falado chegou-se à triste conclusão de que era preciso cortar a árvore. Houve choros, lamentações, gemidos.

A árvore era bela, antiga e venerável. Fazê-la desaparecer era um ato que não só entristecia os habitantes da ilha mas que também os assustava. Mas não havia outro remédio e quase todos acabaram por concordar com o corte.

No lugar onde antes ela se erguia plantaram um pequeno bosque de cerejeiras, pois as cerejeiras nunca crescem muito."
Imagem: cedro japonês

terça-feira, 21 de abril de 2020

Minutos de Leitura (II-3.º Ciclo)

"Estás a ouvir a neve a bater nos vidros da janela, Kitty? Como é agradável e suave o som que faz! É como se alguém lá fora estivesse a encher a janela toda de beijos. Eu bem queria saber se a neve gosta mesmo das árvores e dos montes, pois são tão suaves os beijos que lhes dá! E depois cobre-os com tanto cuidado, sabes... como uma colcha branca, e talvez diga assim: "Vamos dormir, queridos, até vir o Verão outra vez." E quando acordam, no Verão, Kitty, vestem-se todos de verde e põem-se a dançar... sempre que houver vento... Oh, como deve ser lindo! - exlcamou Alice, deixando cair a meada de lã para bater palmas. - Como eu gostava que isso fosse verdade! Tenho  certeza de que no Outono as florestas têm um ar cheio de sono, logo que as folhas começam a ficar castanhas.

Sob o luminoso céu, num sonho, 
 Desliza o barco, vagarosamente. 
Era uma tarde de Julho...

Abraçadas, três crianças 
De olhar brilhante, ouvido atento, 
Felizes, escutavam ingénua história.

Empalideceu já o luminoso céu, 
Perderam-se as vozes e as lembranças,
Geadas outonais invadiram o calor do Verão.

Outras crianças escutarão ainda 
Esta história, de olhar brilhante, ouvido atento, 
Amorosamente abraçadas.

Viajando no Mundo das Maravilhas, 
Esquecidas dos dias que passam, 
Esquecidas dos Verões que morrem.
Deslizam na onda, sonham, 
Demorando-se no brilho da Luz.... 
E a vida, o que é, senão um sonho?"

Lewis Carroll. (2010). Alice do outro lado do espelho. Lisboa: Publicações Europa-América
Imagem: Copyright: Abelardo Morell