A dois de
Abril celebra-se o Dia Internacional do Livro Infantil, em memória de uma dos mais importantes escritores para o público infanto-juvenil (Hans Christian Andersen) e para celebrar a importância do livro infantil. Objecto de leitura e de prazer lúdico como elemento formativo e de incentivo à imaginação. A IBBY (International Board on Books for Young People) todos os anos procura um escritor que se dedicando à escrita de livros para o público infantil possa deixar uma mensagem para celebrar este dia. A mensagem de 2018 foi escrita por Inese Zandere, escritora da Letónia com uma obra premiada há já algum tempo. Eis a mensagem que vale a pena ler e pensar como leitura de um objecto primordial.
"As
pessoas inclinam-se para o ritmo e para o equilíbrio, tal como a energia
magnética organiza as aparas de metal numa experiência da física, tal como um
floco de neve forma cristais a partir da água.
Num conto de fadas ou num poema, as crianças
gostam de repetição, de refrãos e de temas universais, porque eles podem ser
reconhecidos uma e outra vez – trazem ao texto regularidade. O mundo ganha uma
ordem bonita. Ainda me lembro como, em criança, lutava comigo mesma para
defender a justiça e a simetria, pela igualdade de direitos da esquerda e da
direita: se tamborilava com os dedos em cima da mesa, contava quantas vezes
tinha de bater com cada dedo, para que os outros não se sentissem ofendidos. E
quando aplaudia, batia com a mão direita na esquerda, mas depois pensava que
não era justo e aprendi a fazê-lo de maneira contrária – batendo com a esquerda
na direita. Este desejo instintivo de equilíbrio parece engraçado, é certo, mas
mostra a necessidade de evitar que o mundo se torne assimétrico. E eu tinha a sensação
de ser a única responsável por todo o seu equilíbrio.
A inclinação das crianças por poemas e por
histórias surge igualmente da sua necessidade de levar harmonia ao caos do
mundo. Da indeterminação, tudo tende para a ordem. As canções infantis, as canções
populares, os jogos, os contos de fadas, a poesia – são formas de existência
ritmicamente organizadas que ajudam os mais pequenos a estruturar a sua
presença no grande caos. Criam a consciência instintiva de que a ordem do mundo
é possível, e que as pessoas têm nele um lugar único. Tudo conduz para este
objetivo: a organização rítmica do texto, as linhas com letras e o design da
página, a impressão do livro como um todo bem estruturado. O grande revela-se
no pequeno, e damos-lhe forma nos livros infantis, mesmo quando não estamos a
pensar em Deus ou na dimensão fractal. Um livro infantil é uma força milagrosa
que favorece o enorme desejo das crianças e a sua capacidade de ser. Promove a
sua coragem de viver.
Num
livro, o pequeno é sempre grande, de forma instantânea e não apenas quando se
chega à idade adulta. Um livro é um mistério onde se pode encontrar algo que
não se procurava ou que não estava ao nosso alcance. Aquilo que os leitores de
uma certa idade não conseguem compreender, permanece na sua consciência como
uma impressão, e continua a atuar mesmo quando não o compreendem totalmente. Um
livro ilustrado pode funcionar como uma arca do tesouro de sabedoria e cultura
mesmo para os adultos, da mesma forma que as crianças podem ler um livro para
adultos e encontrar nele a sua própria história, um indício para as suas jovens
vidas. O contexto cultural molda as pessoas, estabelecendo as bases para as
impressões que se farão sentir no futuro, assim como para experiências mais
difíceis, às quais terão de sobreviver sem por isso terem de deixar de ser
íntegras.
Um
livro infantil representa o respeito pela grandeza do pequeno. Representa um
mundo que se cria de novo uma e outra vez, uma seriedade lúdica e preciosa, sem
a qual tudo, incluindo a literatura para crianças, seria apenas um trabalho
pesado e vazio."
Inese Zandere, " O pequeno torna-se grande num livro", IBBY, 02.04.2018
Imagem - Cartaz para a versão portuguesa, Fátima Afonso
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