A biblioteca terá que ser o centro da
sociedade. O homem é um animal leitor, leitor do mundo. Procuramos a
constelação das narrações: quem são os outros e onde estamos. Desenvolvemos o
poder da imaginação. Somos capazes de criar o mundo antes mesmo da criação do
mundo.Temos que aprender a conduzir-nos no mundo e a contar histórias. Criamos
bibliotecas porque precisamos de saber quem somos, de onde vimos e para onde
vamos. As bibliotecas são a memória pública e a memória privada.
A biblioteca é a autobiografia de cada um.
É o rosto de cada um de nós. As bibliotecas são também a biografia da
sociedade, a sua identidade. As bibliotecas públicas são o rosto da comunidade.
Nós somos o que a biblioteca nos recorda o que somos. Um livro conta a
experiência de cada um, onde estão as paixões mais secretas e os desejos mais
íntimos. “Clínica da alma” é a melhor definição de biblioteca. A centralidade
da atividade intelectual está na clínica da alma!
Alexandre Magno viajava sempre com o livro
A Ilíada. O livro fazia-o aprender que as vítimas são tão importantes como os
triunfadores. Um rei da Pérsia levava sempre os livros da sua biblioteca quando
viajava - 117 mil livros - por ordem alfabética. No séc. XV, o conquistador
Pedro de Mendoza levou 7 livros para fundar a cidade de Buenos Aires, autores
como Petrarca, Virgílio, etc. Um conquistador leva a história de um outro povo
para fundar outro povo, para que a biblioteca seja universal.
Duas figuras simbólicas: o Papa Gregório I
(séc. VII) decidiu que a Biblioteca Palatina não devia ter autores pagãos e
decide queimá-la, elegendo só alguns autores para lá permanecerem; S. Isidoro
de Sevilha que afixa à porta da biblioteca “Aqui há obras cristãs e não
cristãs”. Temos que deixar S. Isidoro acompanhar-nos nas bibliotecas, na
procura da universalidade.
Falar da universalidade para a biblioteca
virtual é uma ambição: ter todos os livros do mundo e continuar a ter os mesmos
problemas da biblioteca de Alexandria. Os bibliotecários de Alexandria para
resolver o problema da pesquisa de um documento precisavam de um motor de busca
para encontrar o livro. Temos que estabelecer uma forma de pesquisa na
biblioteca universal, o motor de busca perfeito. A biblioteca virtual não pode
bastar-se a si mesmo.
Vivemos num mundo incoerente, absurdo, as
bibliotecas dão uma certa coerência ao mundo. Não podemos esquecer-nos. À porta
da biblioteca eu colocava “Clínica da alma- aqui se encontram livros de todo o género”,
e colocava também uma pergunta “para quem são estes livros, para quem é esta
biblioteca? Para quem é a tecnologia? Isto dá responsabilidade à biblioteca!
Alberto
Manguel. “Reading and libraries”. (resumo aproximado). 02.2012.
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