"Não podemos escrever sem a força do corpo." (Marguerite Duras)
Margarida Ferra publicou há já
alguns anos um livro de poesia, Curso intensivo de jardinagem que
nos introduz numa temática que é a chave temática escolhida este ano, a palavra
e o mundo e neste caso, como em outros, a viagem pela cidade. Nesta primeira
abordagem à cidade a poesia de Margarida Ferra revela-nos como o quotidiano, os
objectos são formas de criação de imagens, de referência na memória.
O livro divide-se em quatro partes e há
nele uma constância. A ideia de que o corpo é uma forma de conhecimento. Nosso
e do que nos rodeia. E igualmente a ligação entre a jardinagem e o acto de
escrever poesia. Ainda com esta ligação em mente deparamos com a tentativa de
uma prática, de uma aprendizagem feita de energia, de brevidade pela
observação, de rapidez na descrição e de utilização de recursos estilísticos
mínimos. A poesia que encontramos explora locais, espaços, vivências,
desencontros. Ela apresenta-se como uma exploração de procura que aposta na
simplicidade do que encontra.
A epígrafe de entrada do livro de
Marguerite Duras envolve-nos nessa observação que carece de uma energia. A que
importa para as plantas e também para os versos, pois a beleza que se quer
redescobrir e ver no quotidiano exige um esforço, uma atenção. Curso intensivo
de jardinagem é um livro de poesia sobre o essencial, sobre o que vemos, sobre
o que escolhemos ver. Acrescenta de uma forma muito luminosa imagens
fotográficas dessa exploração do quotidiano.
O sentido do corpo para a construção
da poesia é verificável pela utilização da visão, ou do olfacto, ou ainda pelo
som, ou pelo paladar. Existem muitos versos a confirmar esta forma de
exploração do quotidiano. É na primeira parte do livro que este tipo de registo
mais se apresenta. O quotidiano e os seus diversos gestos. Na segunda parte é a
casa que é o centro do olhar da poesia. Lugar de acolhimento, mas também de
desconforto. Há no entanto a procura de uma ligação entre os espaços numa
observação dominada pela sensibilidade.
Nas últimas duas partes do livro os poemas
caracterizam-se por serem breves. Ainda encontramos o corpo que percorre os
espaços, que explora e observa em pequenas observações e nos dá ainda com um
sentido de grande sensibilidade a sua transformação na poesia, na palavra, na
capacidade de criar um corpo de memória.
Imagem: Copyright - 半夏生の朝に - あたりまえの暮らしを護っていかれるのだろうか。
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