Na
trama da relação que constituem a história, que o espírito dos seres homologa
ou veta mas que jamais se livra em sua solidão sem paz, somos nós que nos
buscamos ou é o encontro objectivo que se dá? De que adejar de antenas ou
tremor de cílios se faz o fadário de cada um?
Onde
topámos com alguns dos que nos acompanham agora a peregrinação? Onde os
reacharemos, quando se afastam cansados da partida? Essas naves sobrecarregadas
de destinos diversos, agrupados em contingentes afins, que é no que consistem
os bairros de Paris nos princípios do século, ora encalham nos bancos da morte
ora zarpam rumo a um futuro de alguma eternidade.
Poucas
vezes se perderá Amadeo pelas conversas de rua. (...) A ganância da fama não
lhe anulará a reflexão e, quando profetiza que haverão de disputar-lhe os
trabalhos a preço de oiro, não o faz pela cegueira da ambição defraudada. É
muito menos um vaticínio que o resultado de uma equação para que já dispunha
dos termos necessários e suficientes. Pressente-se-lhe nas cartas um pensamento
que preexiste a acção, o que é muito raro nos artistas. Na pintura, também,
será a mesma natureza.

Ainda nisso radicará a monomania da
poupança, sintetizada nos pincéis cuidadosamente perfilados em seu canjirão de
Bisalhães, na mina de lápis que se aguça nem mais nem menos que o preciso, nos
restos virgens de Whatman que para as contas se aproveitam ou para o rascunho
de um bilhete.
Mário Cláudio.
(2016). "Amadeo", in Triologia da Mão. Lisboa: D.
Quixote, págs. 48 - 50.
Imagens:
Copyright - Biblioteca de arte - Fundação Calouste Gulbenkian
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